Colaboradores do Hospital Regional da Chapada (HRC), em Seabra, denunciaram que estão há dois meses sem receber salários. A unidade hospitalar é administrada pela Associação de Proteção à Maternidade e Infância de Castro Alves (APMI), apontada pelo Ministério Público Federal (MPF) como parte de um esquema de desvios na saúde da Bahia (leia mais aqui). Por conta do imbróglio, o governo do estado está em processos de rescisão unilateral com a empresa.
A denúncia foi feita pelo Movimento dos Enfermeiros, Técnicos e Auxiliares de Enfermagem e demais classes trabalhadoras do Hospital da Chapada, em carta enviada na última segunda-feira (30) à Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab).
A crise teve início na última semana, quando, antes dos funcionários e servidores, 11 médicos apresentaram pedido de demissão por conta da falta de pagamento dos salários.
De acordo com a carta aberta, para resolver a situação, representantes da Sesab foram na última sexta-feira (27) ao hospital para dialogar com os colaboradores. “Foi prometido, que todos os colaboradores permanecerão no quadro. Sobre os pagamentos, informaram-nos que vão priorizar os pagamentos dos salários em atraso dos colaboradores, além de informar também que cumprirão com pagamento das férias vencidas, 1/3 das férias, décimo terceiro e rescisões trabalhistas”, diz trecho do documento.
Em contato com o Bahia Notícias, uma pessoa que trabalha no hospital, em condição de anonimato, indicou que as promessas foram feitas “informalmente”. “Sem garantias de cumprimento do acordo, o movimento vem por meio desta Carta Aberta a Sociedade e SESAB, fazer um apelo em nome de todos os colaboradores do HRC, no sentido de exigir que as garantias verbais sejam formalizadas oficialmente e por seguinte colocadas em prática”, exige o movimento, em outra parte da carta.
À reportagem, a Sesab não explicitou se o pagamento será normalizado nos próximos 15 dias, como diz a carta aberta. “No que tange aos eventuais atrasos com os funcionários, a Secretaria da Saúde do Estado pode reter os créditos da APMICA a fim de quitar as situações citadas”, afirmou, em nota.
Além do atraso no pagamento dos vencimentos, o movimento denuncia que as condições do HRC. “Exigimos ainda condições dignais de trabalho e carga horária justa, pois o que já era excessiva, devido a pandemia, intensificou ainda mais, pela necessidade dos profissionais com suspeitas ou até mesmo os infectados, precisarem ser substituídos, forçando aqueles que já estão na ativa e acumulando até 3 plantões seguidos, chegar ao ponto de receberem ligações durante suas folgas, tendo o funcionário que abdicar do momento de descanso pra ir trabalhar e cobrir a falta dos colegas”, relata o documento.
Por conta da situação, os funcionários exigem “a contratação de mais funcionários, para que se adequem as normas do Coren, já que tanto enfermeiros quanto técnicos e auxiliares atendem em média o dobro definido pelo mesmo, o que impacta diretamente na qualidade de vida do colaborador, tanto quanto no atendimento ao assistido”.
PROCURA POR NOVA OS
Com a APMI envolvida no noticiário policial, a Sesab optou por abrir um processo de rescisão unilateral do contrato de gestão do hospital. No último sábado (28) e nesta terça-feira (1º), a secretaria publicou, no Diário Oficial do Estado, um aviso de licitação para contratação emergencial de uma Organização Social (OS) para gerir o equipamento.
“A medida da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab) assegura o atendimento de emergência da população dos 13 municípios da região, evitando quaisquer desassistências em razão do processo de rescisão contratual com a Associação de Proteção à Maternidade e Infância de Castro Alves (APMICA)”, afirmou a Sesab, em nota enviada ao BN.
Por conta do processo de rescisão ainda em andamento, diretores e coordenadores ligados à APMI seguem trabalhando normalmente, segundo os funcionários. A secretaria explicou. “Até o momento não ocorreu a rescisão contratual com a APMI, mas o processo para rescisão unilateral está em curso, por isso, a equipe de coordenação e direção do hospital continuam trabalhando normalmente”, informou.
A Sesab também não garantiu que, com a contratação de uma nova OS, os atuais funcionários sejam incorporados, mas sinalizou a possibilidade. “A nova Organização Social será responsável pela seleção dos profissionais que atuarão na unidade, mas é comum que ocorra a absorção de quem já atua na unidade.”
O Hospital Regional da Chapada possui 101 leitos, sendo 10 de Terapia Intensiva. A unidade é referência para os municípios de Abaíra, Boninal, Ibitiara, Iraquara, Lençóis, Mucugê, Novo Horizonte, Palmeiras, Piatã, Seabra, Souto Soares, Oliveira dos Brejinhos e Brotas de Macaúbas. Além do atendimento clínico e cirúrgico de emergência, a unidade realiza cirurgias eletivas, bem como oferta atendimento ambulatorial nas especialidades de cardiologia, ortopedia, pediatria, clínica médica, cirurgia geral, angiologia, gastroenterologia, anestesiologia, otorrino, exames de imagem e laboratório.
APMI NA MIRA DA JUSTIÇA
A OS é investigada na Operação Metástase, que desarticulou um suposto esquema de fraude em licitações e desvio de recursos públicos destinados à gestão do Hospital Regional de Juazeiro (HRJ). Ao todo, foram cumpridos quatro mandados de prisão preventiva, um mandado de prisão temporária e 16 mandados de busca e apreensão (leia mais aqui).
A organização criminosa investigada praticava fraudes em licitações públicas, passando a dominar a gestão de inúmeras unidades da rede estadual de saúde sob gestão indireta, por intermédio de diferentes Organizações Sociais de Saúde (OSs), que são controladas por um mesmo grupo empresarial, quase sempre registradas em nome de “laranjas”.
Essas instituições gestoras das unidades de saúde (OSs) passaram a contratar empresas de fachada ligadas ao mesmo grupo, de forma direcionada e com superfaturamento, por meio das quais os recursos públicos destinados à administração hospitalar eram escoados, sem que muitos dos serviços fossem efetivamente prestados ou os produtos fossem fornecidos.
De acordo com a PF, os investigados responderão pelos crimes de fraude à licitação, peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
No esquema, o elo entre o poder público e o suposto esquema seria a diretora da Rede Própria Sob Gestão Indireta (DIRP-GI), Viviane Chicourel Hipólito, que teve os sigilos telefônico e bancários quebrados na força-tarefa (leia mais aqui). Nesta terça, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), garantiu aos advogados de Chicourel o acesso as provas já documentadas na Operação Metástase.