Revista publica detalhes de acusações de assédio sexual contra Marcius Melhem

 

Em mais uma exposição sobre os assédios sofridos pela atriz Dani Calabresa na Globo, detalhes sobre o caso vieram à tona nesta sexta-feira (4). O ex-diretor do Departamento de Humor da emissora, Marcius Melhem, teria até tirado o pênis para fora da calça em um dos episódios em que teria tentado agarrá-la.


 


Os relatos fazem parte de uma reportagem da revista Piauí, que ouviu 43 pessoas para produzir a matéria. De acordo com a apuração, a situação já citada ocorreu em 5 de novembro de 2017, em um bar no Rio de Janeiro, onde o elenco do Zorra comemorava o centésimo episódio do programa. Nesse dia, Melhem teria tentado beijá-la num palco na frente de outros colegas e depois ido atrás dela no banheiro, onde novamente tentou agarrá-la à força, imobilizando os braços da atriz e tirando o órgão genital da calça que usava.


 


Ela teria conseguido se desvencilhar, mas não sem que ele ao menos lambesse o rosto da colega de trabalho. De volta ao salão, Calabresa teria tido uma crise de choro, sendo consolada pelos atores Luís Miranda e George Sauma.


 


O baiano Luís Miranda relatou ter ouvido da amiga que, ao tentar fugir, ela acidentalmente encostou no pênis de Melhem. "Ela me falou o que tinha acontecido na saída do banheiro", lembrou.


 


Três dias depois, Melhem encontrou Calabresa em meio às gravações de um novo episódio do programa e comentou o fato como se não tivesse responsabilidade. "Eu não tenho culpa do que aconteceu! Quem mandou você estar muito gostosa?", teria dito, caminhando em direção à atriz que se esquivava dele. A cena foi assistida pela também atriz Maria Clara Gueiros, que intercedeu pedindo para que ele deixasse Calabresa em paz. A vítima também reagiu com palavras. "Não quero seu abraço nem suas desculpas, você já me agarrou, lambeu minha cara e encostou o pau em mim", apontou.


 


Diante de diversas situações como as narradas, Calabresa resolveu denunciá-lo à Globo. Em 22 de dezembro do ano passado, ela telefonou para Monica Albuquerque, então chefe do Desenvolvimento e Acompanhamento Artístico (DAA), setor ao qual os artistas recorriam para levar suas queixas à época, e marcou uma reunião para o dia 2 de janeiro.


 


Como combinado, as duas se reuniram, ainda com a presença de Jazette Guedes, do DAA. A conversa teria durado mais de quatro horas, com relatos e trocas de mensagens apresentadas por Calabresa para comprovar as denúncias. Quase nenhuma resposta foi dada.


 


A atriz teria saído do encontro com a promessa de que a denúncia chegaria ao compliance da emissora, responsável pela aplicação das normas éticas e de conduta que orientam a empresa. Depois disso, em 20 de janeiro, Jazette teria procurado Dani para informar que conversou com Melhem e recomendou que ele fizesse terapia. A justificativa foi que existia apenas o caso da atriz, portanto, não teriam outra medida a tomar. 


 


Calabresa decidiu pedir uma reunião pessoal com Carlos Henrique Schroder, então nome mais graduado da emissora nas áreas de entretenimento, esporte e jornalismo. Para ele, ela voltaria a relatar os assédios em uma reunião de três horas, ressaltando que não era a única vítima. Schroder concordou que "pedir para fazer terapia" era "inadmissível" e determinou que a investigação prosseguisse.


 


Assim feito, uma semana depois, ela se encontrou com os responsáveis pelo compliance da Globo e voltou a repetir todo o caso, dessa vez por cinco horas. Mas sem muito avanço.


 


Em meio a isso, Daniela Ocampo, apontada como a número 2 do setor de Humor, mobilizou a equipe em prol de assinaturas para uma carta de apoio a Melhem. A essa altura, o caso já tinha vazado, mesmo que parcialmente, para a imprensa (veja aqui). Na carta, assinada por 55 pessoas, o grupo diz que o diretor nunca praticou assédio moral contra qualquer um deles. "Toda solidariedade a Marcius Melhem diante dessa maldade, que não vai destruir a harmonia entre nós, nem o prazer de trabalhar neste projeto que nos orgulha tanto", dizia a mensagem.


 


Agora, à Piauí, Ocampo disse que acredita nas mulheres e está ao lado das vítimas, mas não falou em arrependimento. "Eu agi de acordo com o que eu acreditava na época e hoje sei que tinha uma visão parcial do que estava acontecendo", declarou.


 


De acordo com a publicação, essa carta fortaleceu Melhem, que teria passado a atacar a credibilidade de Calabresa. "O que mais você quer, filha, para calar a boca?", questionou ele em uma gravação obtida pela revista - ele fala como se sua interlocutora fosse a atriz. Em outras gravações, ele afirmou que ela estava manchando o nome da Globo. "Ainda ganha um quadro no Se Joga [humorístico que saiu do ar em março] e um programa no GNT", criticou.


 


Por outro lado, com a coragem de Calabresa, pelo menos outras cinco mulheres teriam ido ao compliance levar acusações de assédio sexual por parte dele, relatando o desconforto em contracenar com ele roçando o pênis ereto nelas.


 


Ainda assim, no dia 6 de março, a Globo emitiu um comunicado informado que, "por motivos pessoais", ele deixaria a liderança de projetos humorísticos (relembre aqui). De fato, o então diretor precisava acompanhar uma de suas filhas, que faria uma cirurgia nos Estados Unidos, mas a emissora sequer mencionou as acusações. Isso indignou as vítimas e testemunhas, que procuraram a advogada Mayra Cotta para obter orientação jurídica.


 


Como elas não queriam judicializar o caso, Mayra criou uma consultoria especializada em compliance com a ativista Manoela Miklos. Em 14 de agosto, quando as representantes ainda se familiarizavam com o caso, a Globo anunciou a demissão de Melhem falando em uma "parceria de 17 anos", agradecendo a contribuição dele para a renovação do humor, e mais uma vez sem qualquer citação às acusações de assédio sexual e moral (veja aqui).


 


Depois disso, um grupo por 30 atores, roteiristas e diretores, entre homens e mulheres, enviou uma carta a Schroder através do e-mail do humorista Marcelo Adnet, ex-marido de Calabresa (saiba mais aqui). As mulheres pediram para não ter seus nomes citados, mas os nove homens foram Antonio Prata, Eduardo Sterblitch, João Gomez, João Vicente de Castro, Maurício Farias, Mauro Farias, Matheus Malafaia, Vicente Barcellos e o próprio Adnet.


 


A chefe do DAA, Monica Albuquerque, teria informado que ele não tinha agenda para receber o grupo, mas que ela estava à disposição de todos para conversas individuais. O grupo, então, insistiu em uma conversa coletiva e ela concordou, mas desde que sem a presença da advogada Mayra Cotta. 


 


Ocorreram duas reuniões via Zoom em que a principal demanda, que era receber um relatório com o resultado da investigação interna, não foi atendida. Monica teria sugerido a possibilidade de a Globo pagar o tratamento psiquiátrico das mulheres que estivessem fazendo terapia, o que também não aconteceu, e chegou a pedir que separassem questões de trabalho das "festinhas", esse último ponto em referência à comemoração do episódio 100. O grupo, é claro, não gostou do conselho, afinal a festa era da empresa e o convite havia sido feito pelo chefe.


 


Foi em meio a essa sucessão de fatos que o grupo escalou a advogada para representá-lo em entrevistas. Mayra detalhou alguns fatos à colunista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, meses atrás. Com a repercussão, Melhem se defendeu, negando as graves acusações. Dessa vez, em nota, ele disse que sente que a sentença já foi dada. "Nada que eu diga sobre fatos distorcidos ou cenas que jamais ocorreram vai mudar esse perfil construído de abusador, quase psicopata", afirmou, acrescentando que vai buscar resolver a situação na Justiça.


 


A Piauí ouviu os executivos da emissora. Schroder, que está de saída da Globo, disse que não poderia falar sobre casos concretos. "Faço questão de reiterar que todo relato de assédio, moral ou sexual, é apurado criteriosamente assim que a empresa toma conhecimento. A empresa não tolera comportamentos abusivos em nossas equipes", afirmou. Já Jorge Nóbrega, presidente executivo da emissora, afirmou que estudam a possibilidade de dar retornos melhores sobre reclamações de assédio sexual. "Sabemos que esses processos precisam melhorar. Queremos ser justos. Queremos que nossas ações sirvam para a correção de problemas". Após o fechamento da reportagem, a Globo anunciou uma reestruturação do DAA e disse que Monica pediu desligamento.

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